V
Canto as mãos que foram escravas
nas galés
Julião Soares Sousa
1.
aos vindouros
deixo as anotações deste meu tempo
e do tempo
que me moldou
vestígios
da minha memória
porque é a única
a verdadeira
herança que importa deixar
2.
habita na minha voz
o arrastar das correntes
o rumor da sanzala
mas canto
canto as aves o mar
com a música da terra
onde deixei o meu olhar
3.
e canto as lágrimas
punhais cravados na face
do meu povo
e canto a esperança
o riso das crianças
do meu povo
4.
conheço o silêncio
das horas amargas
as mãos rentes à face
ocultando o olhar
mas sei também das sílabas
que em música se erguem das cinzas
no orgulho de resistir
in "Nove ciclos para um poema" (edium editores, Matosinhos, Portugal, 2008); "Viagem pelos livros" (Escrituras, São Paulo, Brasil, 2011) - Prémio Literário da Lusofonia - 2007, organizado pela Câmara Municipal de Bragança
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