sexta-feira, 16 de maio de 2014

In Memoriam - Miguel de Castro

Miguel de Castro faleceu em 2009. Nessa altura, dediquei-lhe o seguinte poema que, hoje, aqui deixo à guisa de homenagem.


ao Miguel de Castro


subamos as escadas mas depressa
não há tempo a perder

rasga-me a carne o relógio
como o arado a terra

vamos depressa
depressa
porque é urgente subir

sabes
como no teu poema
temos vinho e cigarros
e até uns trocos trago na algibeira

se não chegarem para as putas
para que as enganemos noite adentro
e durmamos em verso no bordel
que sirvam para uns caracóis

ou então para as balas da pistola
com que rebentaremos os miolos
aos comedores de croquetes

e há tantos nisto da poesia

e no meio das metáforas
vamos
como escreveste há tanto tempo
morrer, sem glória, em qualquer luta

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Para a Graça Soares

Para a Graça Soares, minha esposa, no dia do seu aniversário. É um poema já com algum tempo, mas que se mantém bem actual e do qual tirei a epígrafe para os poemas dedicados aos nossos filhos.


à Graça Soares


meu amor não me esperes quando a noite
acordar em meu olhar
não me esperes
de nada vale o tempo que gastares
à janela da vida
que só a ti pertence

não te iludas
com as coisas da moral
que os vizinhos costuram nas ombreiras
com as manhãs que dizem que hão-de vir
nevoeiro algum diz do meu regresso
todo o nevoeiro
pronuncia somente o meu partir
nada mais que a minha ausência

por isso parte todas as molduras
todas
rasga as fotografias
apaga os risos
as lágrimas

diz aos filhos que a via é sempre em frente
onde o sol é bandeira desfraldada
com as suas próprias cores
e que rumem rumo ao sonho
porque antes vivê-lo um segundo
que chorá-lo toda a vida

bem sabes que a minha morte
só a mim pertence
e a mais ninguém