quarta-feira, 15 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 14


III PARTE

LISTEL

CASTELO DE MONTE-MAYOR

Acordai,
pedras,
que vos chamo.

Dizei-me
dos segredos e sonhos
das mãos que vos ergueram.

Dessa alta mirada,
de onde olhais para a lonjura,
falai-me
do curvado povo
nos arrozais,
do sereno
ofício do sol,
das lendas
que o Tempo,
em seu lento caminhar,
em vós guardou.

Acordai,
pedras,
que em breve partirei.

Levar-vos-ei comigo
como quem leva um verso
ou uma ave
no olhar.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

terça-feira, 14 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 13


Terceira Faixa Ondada - DIOGO DE AZAMBUJA

Quem o rio sente,
sonha o mar.

Cedo aprendeste
a soletrar
os ventos e a lonjura.

Talvez aqui,
no topo
desta Torre de Menagem,
com o olhar navegando
pelos dóceis campos
do Mondego.

Havia
no teu corpo
uma vela a enfunar
e um mor desejo a cumprir.

E rumaste para sul
com as aves
consortes do sol.

E ergueste na distância
o grito em pedra
da tua demanda.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 12


Segunda Faixa Ondada - O SEM NOME

Não contaram minha história.

Não houve rima
ou tempo
ou pena
ou tinta.

Trouxe nas mãos o ofício dos ventos,
da madeira navegante.

O pouco que era meu,
comigo foi.

Fui gente,
somente,
mas zarpei.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

domingo, 12 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 11


Primeira Faixa Ondada - FERNÃO MENDES PINTO

Nas mãos,
toma o próprio destino.

Há,
ao longe,
um mundo e outro mundo
se abre no olhar.

Viandante,
não de sandálias
por pó urdidas,
mas de arestas do sonho
a oiro traçadas.

Não de cajado
sob o peso da amargura,
mas de hirto ensejo
de demandar para além,
para lá da raiz
da própria distância.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

sábado, 11 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 10


Segunda Flor de Lis - MANUEL DE MACEDO

O olhar
é qual ave de rapina.

É um imenso rio
onde todas as cores
se encontram
e comungam
do mesmo ensejo.

Cada paleta traz
o sentido de um grito,
de um silêncio,
de um sonho,
uma memória.

O olhar cativo,
em fuga,
em fúria,
em febre ardendo à flor do branco.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 9


Primeira Flor de Lis - MANUEL JARDIM

Alva era a luz.

A tela,
a janela desperta para o mundo.

E as mãos,
essas,
eram as obreiras:

colhiam mel em silêncio.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 8


Terceira Torre - AFONSO DUARTE

Escuto os teus poemas
e sente-se no sangue,
que flui em teus versos,
a voz do teu povo.

O que se ama
porque dele brotámos.

E a palavra mãe.
A palavra filha.
A telha vã.

O aroma da terra
de rosas florindo
e as mãos levando
seus espinhos.

E a palavra como enxada,
sulcando a página,
fecundando cada verso
com os gestos.

Escuto
em teus poemas
o rumor do Mondego.

Repara como dorme em tuas mãos.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 7


Quina de Portugal - ANTÓNIO CORREIA DA FONSECA ANDRADE

De onde vem este rio imenso
onde meus olhos se descobrem?

Que asas de ouro
o fazem voar ao poente?

Que fogo é este
que lhe adoça a face?

De onde vem?
Por que águas?
Por que sal?

Indago a semente
deste fruto,
desta flor
qual nascente deste rio.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

terça-feira, 7 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 6


Segunda Torre - FRANCISCO PINA E MELO

Havia a palavra
e a exacta medida
de cada verso.

Trazia nas mãos
todos os utensílios
e o fogo
germinando no olhar.

Cada palavra
era delicada,
do mais puro ouro.

Brilhava
qual metáfora solar,
filigrana
iluminado de dentro.

E cumpria
o seu supremo ofício
de ourives da poesia.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 5


II PARTE

ESCUDO

Primeira Torre - JORGE DE MONTEMOR

Nasce o poema,
a palavra,
a sementeira do verbo,
da música.

Lo deseo,
eres la palabra
susurrada
de todos los ríos.

Tal vez
la palabra amor.

Talvez
a palavra dor.

Talvez.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

domingo, 5 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 4


Quarta Torre - ANTÓNIO RODRIGUES CAMPOS

Não há futuro sem passado,
fruto sem semente,
poesia sem música.

Tudo seria terra árida,
vento agreste,
rio sem desejo
de ser mar.

Um povo sem memória,
é um povo
que se resigna
a perecer.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004.

sábado, 4 de outubro de 2014

Para mim

No dia do meu aniversário, deixo aqui um auto-retrato. Tem alguns anos, mas continua actual. Agradeço a Bocage a ideia.

AUTO-RETRATO

Magro, de olhos escuros, cara linda,
Que é do mundo o menino mais bonito,
Lhe disse a sua mãe, e diz ainda.
De resto resta a barba, e tudo dito.

Agora lá por dentro, na conduta,
Nessa coisa moral, nada a dizer,
Porque ave de rapina que labuta
Preocupa-se mais se tem comer.

Quanto ao amor, ai que lamechice!
Que fique na gaveta bem guardado,
Porque, desde a infância à velhice,
Só o homem, não o autor, o tem usado.

Eis, pois, Xavier Zarco, que sem treta
Fez-se em retrato em cauda de cometa.


sexta-feira, 3 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 3


Terceira Torre - ESTHER DE CARVALHO

Quando o pano sobe
e a luz nasce,
é outro
que não eu
que vos surge
rente ao olhar.

Mesuro o ser
por gestos e palavras
e trago-vos as novas
de um mundo novo,
o vosso,
mas diverso.

in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 2


Segunda Torre - MOUROS

Vinham do sul
traziam na tez
a coloração do sol
e a mestria
de domar as águas.

Bebiam dos rios
as palavras
que semeavam
ao ritmo das estações.

Também aqui
por terra de Munt Malur,
pelos campos do Mondego,
cultivaram tempos
e memórias.

O seu legado,
escuta-o,
vem na voz do vento,
no murmurar da terra,
no sussurro das pedras.


in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004. 

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Sobre “Fui... O que já não sou!”, de Paulo Themudo



Um livro é como uma casa. Antes de se entrar na casa, há que a descobrir. Existem várias formas para se chegar à casa: o acaso, através de indícios ou, mais comodamente, a exacta referência. Mas, independentemente da forma de a encontrar, a casa é, existe, assume-se como um dado físico, concreto, com as suas paredes, portas, janelas...

Sob o olhar, a casa revela-se, não só na sua condição material, mas como parte integrante de um lugar, talvez de um arruamento e com o seu próprio número de polícia.

A esta abstracção, poderemos atribuir-lhe o valor de um título. No caso em apreço: “Fui... O que já não sou!”. E este é o nome desta casa.

Utilizo a imagem da casa porque é o espaço referencial, o espaço da emoção, dos afectos, da família, dos amigos, mas, também, é o espaço da solidão e, sobretudo, é o nosso templo, espaço de reflexão, de meditação. No fundo, serve de refúgio, é o nosso canto. Talvez por isso, diga o poeta, num poema intitulado: “Eu...”, texto com que nos abre a porta desta casa, o seguinte:

“agarro o transpirar das janelas, escudos protectores das palavras”(1)

Ou seja: o espaço é habitado por palavras. Portanto, não será de estranhar que uma delas seja fulcral na leitura deste poemário. Esta é a palavra criança. Palavra que nos surge na exacta medida, ou seja: a sua repetição corresponde ao fragmento “Fui”, anunciando desta forma o fragmento “O que não sou”.

Em resumo, estando perante um livro composto por trinta e quatro poemas, essa referência deveria ocorrer dezassete vezes e, de facto, assim acontece. Repito o que escrevi no prefácio:

“feito de arte, criação humana”(2)

Criança, para além do que intuitivamente nos é apresentado, traz-nos a ideia da esperança, a capacidade do sonho, da criação. Por isso, diz o poeta:  

“Que eu não seria nada do que sou se não fossem os sonhos”(3)

Ou seja, a criança como o princípio, o elemento matricial do homem. No entanto, mesmo quando alude ao sonho, é necessário, urgente reforçar essa presença, e isso acontece no poema intitulado sugestivamente “Escrevo o sonho”, referindo:

“Não desisto de ti
Que és nome silencioso
Que madruga e veste
As minhas mãos”(4)

E porque o sonho, a criança em acção, se pode única e somente justificar perante o outro, o leitor, pelos actos, pela liberdade, o poeta, no mesmo poema, profere:

“Construí um rio de palavras
Para adormecer nas mãos de alguém”(5)

Esta é uma importante referência. Chamo pois a atenção a este poema. É, na minha leitura, de suprema relevância para o entendimento deste ciclo poético. No fundo, talvez seja o desvelar da própria essência da sua visão de arte poética: a consciência de que tudo o que se escreve só tem validade a partir do instante em que o leitor se apropria do poema. Das palavras que, numa imagem de serenidade, se recolhem nas mãos do leitor, ou, utilizando as palavras do poeta, nas mãos de alguém. Essa partilha, dá-se porque, e assim diz Paulo Themudo: 

“Eu fui feito de tudo
Caí, debrucei-me nas ondas do mar”(6)

E só no mar é possível exercer a navegação, partir em busca de quem se sabe ou presume existir num qualquer porto, num qualquer cais, talvez mesmo entre escombros, um náufrago que demande a palavra poética. 

No entanto, o poeta sabe que o leitor necessita dos artefactos essenciais para  que a sua descodificação seja possível, daí afirmar:

“A luz maravilha-se com o sabor de algumas palavras
As páginas trémulas libertam-se na voz madura
Esculpo a sala onde me entrego
Pinto as paredes com um sorriso”(7)

Esta é a magia da Poesia, a sua capacidade de metamorfose para o ofício de partilha entre o poeta e o leitor. Desta forma, confessa o poeta:

“Quase em silêncio entrego o nome
Nas páginas pálidas de papel
Lugar que deu lugar ao sonho”(8)

Reparem que o escritor repete a palavra lugar, reforçando desta forma a ideia da transferência quase diria metempsicótica nesse lugar, a casa, onde a criança se assume na plenitude porque, escreve Paulo Themudo, 

“As palavras são agora, alma, estrada”(9)

Há pois que caminhar. E o poeta toma como sua essa lição, mencionando: 

“A estrada é a mesma
Parece que se estendeu”(10)

Mas o caminho de um poeta, como antes já insinuei, é feito de palavras, palavras que habitam no coração da casa. Elas são a sua razão de existir. É através delas que pode erguer a sua obra, ou seja: a matriz do objecto que oferece ao leitor. Por esse motivo, a dado momento, menciona:

“Os meus olhos já te dizem tanto
As minhas mãos já te entregam tanto
Só preciso das palavras...”(11)

Mas não antes, como um pouco mais à frente refere, de transformá-las na sua oficina, porque o labor do poeta reside na configuração de novos sentidos para a 

matéria que utiliza, como o próprio refere:

“Invento no sabor de uma palavra
O significado de começar”(12)

Porque é um ciclo em que se regressa sempre ao ponto inicial, à criança, à palavra criança e a toda a carga evocativa que esta palavra possui, dizendo:

“Qualquer distante encanto
Faria sentido...”(13)

E esse encanto surge, mesmo quando é a ausência das coisas mais simples o quadro onde esse encanto se movimenta. 

“A criança corre, sorrindo,
A mesa vazia, mas vai sorrindo,
A lareira apagada, mas vai sorrindo,
A chuva molhando, mas vai, dormindo.”(14)

Mas o encanto persiste, porque a criança existe e exige, tornando este numa condição essencial, mesmo quando é nada o que se presume. Ele resiste à devastação, à erosão temporal desde que se saiba ou queira descortiná-lo. Nas palavras do poeta, esta é a sua imagem:

“Da pequena janela
Surge um braço de luz
O nascer de uma estrela, era noite, aguarela”(15)

E a casa vista de fora mesura-se como refúgio

“Refúgio é o corpo que dormia”(16)

Na casa, o corpo que dorme é o palco do sonho. Abre em si as portas da imaginação do homem. Aí, ele sente-se pleno, consciente do que nesse lugar mágico for capaz de descobrir, de decifrar, fá-lo-á superar-se, mesmo que, ao acordar, questione: 

“Que silêncio te esconde
A morada perdida”(17)

Porque só através de um incessante questionamento sobre todas as coisas, mesmo que provoque angústia a resposta sempre provisória, ele pode avançar, caminhar, embora tendo essa provisória certeza do que foi, do que já não é, mas sabendo sempre que:

“Para trás o vazio
Agora, sou vida!”(18)

Direi mais: é futuro, capacidade de sonho porque desoculta a criança em si, redescoberta e reconquistada.



NOTAS:
(1) THEMUDO, Paulo – “Fui... o que já não sou!...”. Edium Editores. São Mamede de Infesta. 2008. P. 7
(2) ZARCO, Xavier – “Prefácio” in THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 3
(3) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 8
(4) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 17
(5) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 17
(6) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 19
(7) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 22
(8) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 23
(9) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 27
(10) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 41
(11) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 43
(12) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 45
(13) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 50
(14) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 56
(15) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 56
(16) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 72
(17) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 76
(18) THEMUDO, Paulo – Ob. Cit.. P. 80

de "Monte Maior sobre o Mondego" - 1


 


I PARTE

COROA

Primeira Torre – ABADE JOÃO

Pela nobreza,
não lutara,
mas pela dor de nada ter.

Só este silêncio informe
de um preso grito
numa imagem
repetidamente exposta
de amado corpo degolado.

E a mourama aqui tão perto,
cercando
asfixiando o próprio poema.

E o vento
calando na pedra
a canção da vitória.

Ouve, a morte ri,
não vem do rio,
desce das muralhas.

Escuta,
não fora a esperança
que fenecera,
era o medo a germinar.


in "Monte Maior sobre o Mondego" (e-book, ArcosOnline, Arcos de Valdevez, Portugal, 2006; Temas Originais, Coimbra, Portugal, 2010) - Menção Honrosa (Poesia) no Prémio Literário Afonso Duarte - 2004.