segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Posfácio a "Amar em Chão de Mar", de Dalila Moura Baião



Ao chegar a este texto, o leitor sabe de onde vem, que caminho trilhou, que imagens, sons colheu ao longo dos três ciclos que compõem esta nova obra de Dalila Moura Baião.

Sabe o sabor real, isto é: o que, de facto, conta; deste “Amar em Chão de Mar”, porque o livro, o que está contido em todas as suas páginas, mas, sobretudo, o que se encontra a descobrir entrelinhas, pertence-lhe.

Não é pertença secreta da poetisa que, ciosamente, o guardou, imaginemos, na tal gaveta de que tanto se fala, mesmo que essa gaveta de móvel antigo agora corresponda a uma página de internet ou a espaço de disco duro.

Após o que acima escrevi, tendo o privilégio de ler este livro antes de ser objecto que agora folheia, amiúde recorri ao “Varandas de Luar” procurando traços comuns como se demandasse um álbum fotográfico em busca de pontes que unam estas margens, estes dois poemários.

Dalila Moura Baião escreve-nos com alma, não só por nesta poetisa eu descobrir paixão, pelo acto de escrita em si e pela forma como nos traz retratos do real e os enforma em sentir, mas também pelo sentido de movimento, de pulsar na construção do verso e na estruturação e articulação da obra.

Neste volume encontram-se três movimentos, três instantes que se nos apresentam segmentados. 

No primeiro descobrimos um isomorfismo, mas liberto da convenção estruturalmente instituída para o soneto, ou não fossem “Poemas de mar, de vento e vida”, ou seja, tal como escreveu Fernando Pessoa: “Navegar é preciso / Viver não é preciso”. Precisão na apresentação, na via que há a percorrer, mas, porque essência dos três elementos referenciais deste ciclo, imprevista, plena de surpresa, a sua elaboração em verso.

No segundo movimento, a decifração possível do que é o nosso mundo íntimo, mesmo que, de quando em vez, se sinta que essa janela por onde se olha o mundo, recolhe em si mesma o olhar do próprio mundo. Trata-se de um puzzle, aparentemente caótico, pela profusão temática, mas que, no final, nos leva à proximidade do rosto do mundo que se vislumbra por essa janela, cabendo, portanto, ao leitor essa recolha de peças, quase diria traços e tonalidades, para esse erigir de rosto.

E, finalmente, o terceiro movimento, que nos é apresentado como retalhos, mas que são, na sua matriz, a verdadeira essência dos dois primeiros ciclos, isto é: neste último, pode o leitor descortinar referências, quer no plano afectivo, com especial relevo aos poemas inaugurais, onde a figura mãe predomina, quer no plano intelectual, que tornaram possível a feitura do poema, aquele que a poetisa escreveu e aquele outro, aquele que qualquer poeta procura.


Coimbra, 3 de Dezembro de 2010


in BAIÃO, Dalila Moura - "Amar em Chão de Mar". Temas Originais. 2010

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